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Na última sexta-feira, dia 1º de março de 2024, o Conselho Monetário Nacional (CMN) editou a Resolução nº 5.121, que aprimorou e esclareceu as regras recém-editadas sobre as restrições aos lastros em operações de Certificados de Recebíveis Imobiliários (CRI) e Certificados de Recebíveis do Agronegócio (CRA). A nova norma flexibiliza algumas vedações introduzidas pela Resolução do CMN nº 5.118, de 1º de fevereiro de 2024. No entanto, segue inalterada uma das questões mais polêmicas da Resolução CMN nº 5.118, qual seja, a vedação ao reembolso de despesas.
A Resolução CMN nº 5.118 foi introduzida com o objetivo de redefinir o público-alvo apto a se beneficiar de captações de recursos por meio de operações de CRI e CRA, de modo a direcionar investimentos mais diretamente aos setores imobiliário e do agronegócio. Assim, a referida norma estabeleceu originalmente que os CRI e os CRA não podem ter como lastro “títulos de dívida” cujo devedor, codevedor ou garantidor seja o “público vedado” definido pela referida norma, composto por (a) companhias abertas ou partes relacionadas a companhias abertas, exceto se o setor principal de atividade da empresa for o setor imobiliário, no caso dos CRI, ou o agronegócio, no caso dos CRA, ou (b) instituições financeiras ou entidades autorizadas a funcionar pelo Banco Central do Brasil, ou suas partes relacionadas.
A definição de “títulos de dívida” trazida pela Resolução CMN nº 5.118 era bastante abrangente, fazendo menção genérica a “títulos, valores mobiliários e instrumentos contratuais […] de promessa de pagamento futuro […]”. Com base nessa redação era possível enquadrar na definição de “títulos de dívida”, praticamente, qualquer tipo de contrato ou instrumento capaz de originar créditos imobiliários ou do agronegócio, o que resultava, em última análise, na vedação, como lastro de CRI ou CRA, a qualquer tipo de crédito cujo devedor, codevedor ou garantidor fosse o público vedado definido pela norma. A nova Resolução CMN nº 5.121 esclarece que a definição de “títulos de dívida” não abrange contratos de natureza comercial, como duplicatas, contratos de locação, compra e venda, e usufruto relacionados a imóveis. Dessa forma, seguem vedados como lastro de CRI e CRA apenas os títulos que representam dívida de operação financeira cujo devedor, codevedor ou garantidor seja o referido público vedado, não havendo vedação aos créditos decorrentes, por exemplo, de contratos de locação ou compra e venda de imóveis, ainda que tenha como devedor, codevedor ou garantidor o referido público vedado.
A nova Resolução CMN nº 5.121 também altera o público vedado definido originalmente na Resolução CMN nº 5.118, substituindo o conceito de “partes relacionadas de instituições financeiras ou entidades autorizadas a funcionar pelo Banco Central do Brasil” pelo conceito de “entidades integrantes de conglomerado prudencial ou suas respectivas controladas”. Dessa forma, deixam de integrar o público vedado da referida norma as companhias abertas cujo setor principal de atividade seja o setor imobiliário ou do agronegócio, conforme o caso, assim como as demais sociedades que não sejam companhias abertas, ainda que possuam como controlador sociedade que também detenha o controle de instituição financeira ou outras entidades autorizadas a funcionar pelo Banco Central do Brasil.
Lamenta-se, no entanto, que a Resolução CMN nº 5.121 não tenha alterado um dos pontos mais controversos da Resolução CMN nº 5.118: a vedação ao reembolso de despesas. O reembolso de despesas foi admitido nas operações de CRI a partir de consulta formulada ao Colegiado da CVM, respondida em 2019 ¹, tomando como parâmetro o disposto na Lei nº 12.431, de 24 de junho de 2011, que permite o reembolso de despesas em operações de debêntures, CRI e fundos de investimento em direitos creditórios (FIDC) destinados a implementar projetos de infraestrutura. Assim como nos projetos de infraestrutura, o timing dos negócios imobiliários costuma ser mais acelerado que o da estruturação das correspondentes operações financeiras que virão a financiá-los, principalmente caso envolvam a securitização de créditos via CRI. Dessa forma, a possibilidade de reembolso de despesas permitia ao empreendedor realizar tais negócios total ou parcialmente com recursos próprios ou até com a realização de operações de crédito pontuais (tais como os chamados “empréstimos ponte” ou “bridge loans”), para o posterior ressarcimento ou quitação dessas operações de crédito com a utilização dos recursos oriundos da operação de securitização. A vedação ao reembolso de despesas inviabiliza a realização de operações legítimas, conduzidas por empresas que integram o público-alvo prioritário das operações de CRI e que atendem aos objetivos últimos desse instrumento.
As alterações trazidas pela Resolução CMN nº 5.121 são positivas, na medida em que corrigem algumas distorções que acabavam por vedar a realização de operações por determinadas empresas que constituem o público-alvo prioritário dos CRI e CRA, bem como de outras operações que indiscutivelmente beneficiam os setores imobiliário e do agronegócio, por se enquadrarem como imobiliárias ou do agronegócio em sua origem. Permanece, no entanto, a necessidade de se revisar a vedação irrestrita ao reembolso de despesas nas operações de CRI e CRA.
O Bicalho Navarro Advogados está à disposição para o aprofundamento das discussões e maiores esclarecimentos sobre o tema, inclusive para eventual análise dos impactos da nova norma em projetos em fase de concepção.
¹ PROC. SEI 19957.001522/2017-12