A Reforma Tributária, regulamentada pela Lei Complementar nº 214/2025, altera a configuração e a lógica dos tributos sobre o consumo, baseada, genuinamente, na neutralidade tributária. A tributação buscará a substância econômica dos negócios jurídicos.
Sai de cena a tributação sobre a receita bruta ou o faturamento e inaugura-se a tributação sobre o fornecimento de bens e serviços, conforme redação do art. 3º, inciso II da LC 214/2025[1]. A ampla definição de fornecimento passa a abarcar operações que não necessariamente envolvam contraprestação financeira, focando na efetiva disponibilidade e fruição do bem ou serviço.
Por tal racional, a cessão gratuita de serviços passa a configurar um potencial fato gerador do IBS e da CBS. Como ficam as holdings familiares, notadamente aquelas que detêm imóveis utilizados a título gratuito por seus sócios?
Como funcionará na nova dinâmica?
Na nova dinâmica, a gratuidade passa a ser vista como renúncia de receita! Independentemente do efetivo pagamento, a nova realidade pretende tributar a utilidade/disponibilidade econômica, correspondente ao fornecimento em si, ainda que sem natureza comercial. Na hipótese levantada, o fornecimento de serviço parece ser incontroverso: a holding familiar estará, de fato, fornecendo serviço de locação para seus sócios, ainda que a título gratuito.
De acordo com o art. 3º da LC nº 214/25, é inconteste que o referido serviço de locação passará a ser tributada pelo IBS e CBS. Nesse sentido, poderá o Fisco arbitrar a base de cálculo dos novos tributos, caso inexista contratação formalizada entre a pessoa jurídica e seus “sócios-locatários”.
A nova Lei Complementar, nesse aspecto, dialoga com o Regulamento do Imposto de Renda de 2018, em seu art. 41, § 1º, dispositivo esse que, apesar de constar há tempos em nosso ordenamento jurídico tributário, nunca teve aplicação plena, na prática. Vejamos:
(…)
- 1º Na hipótese de imóvel cedido gratuitamente, constitui rendimento tributável na declaração de ajuste anual o equivalente a dez por cento do seu valor venal, ou do valor constante da guia do Imposto Predial e Territorial Urbano – IPTU correspondente ao ano-calendário da declaração, ressalvado o disposto na alínea “b” do inciso VII do caput do art. 35 ( Lei nº 4.506, de 1964, art. 23, caput, inciso VI ).
Além dele, vale lembrar que há atualmente previsão legal (art. 4º da Lei nº 14.596/23, que exige que essa relação entre partes relacionadas se dê obrigatoriamente por valores de mercado, tornando ainda maior o potencial de incidência dessa tributação.
A nova Reforma Tributária do Consumo traz quais outras soluções?
Se, anteriormente, a fiscalização não conseguiria “enxergar” ou perseguir a tributação sobre imóveis cedidos a título gratuito, a nova Reforma Tributária também parece trazer a solução para tal empecilho! O novo mecanismo em questão já foi abordado por essa série e denomina-se CIB – Cadastro Imobiliário Brasileiro[2].
À medida em que o CIB se consolidar como identificador único e digital, que albergará todos os bens imóveis do País, cruzando informações provenientes de diversas fontes, a fiscalização terá à disposição informações precisas dos imóveis cuja propriedade seja de holdings familiares, os respectivos locatários e as bases sobre os quais incidirão o IBS e CBS.
A organização patrimonial e sucessória deverá considerar esse efeito, dentro das suas múltiplas finalidades, como proteção de ativos, organização e administração centralizada de bens, planejamentos sucessórios e antecipação de heranças.
[1] Art. 3º Para fins desta Lei Complementar, consideram-se:
(…)
II – fornecimento:
- a) entrega ou disponibilização de bem material;
- b) instituição, transferência, cessão, concessão, licenciamento ou disponibilização de bem imaterial, inclusive direito;
- c) prestação ou disponibilização de serviço;
[2] https://bicalhonavarro.com.br/o-que-e-e-como-funcionara-o-cib/
